Dispositivo promove avanços importantes, mas não contempla realidade de alguns segmentos, como espetáculos teatrais
Finalmente, após muitas notícias nem sempre verdadeiras, foi publicada a nova Instrução Normativa que traz alterações às regras de acesso e uso da Lei Federal de Incentivo à Cultura. Várias das mudanças melhoram o fluxo da prestação de contas, simplificam os processos de análise e aprovação das contas, implantam uso de sistema online e inteligente, bem como incluem previsões mais detalhadas para respaldo das decisões técnicas. É um avanço importante.
Por outro lado, com o objetivo de acertar musicais e artistas famosos, as mudanças impactarão gravemente as artes cênicas em geral, dificultando a execução de projetos pelos produtores independentes, que são um dos grandes empreendedores das artes. Fato é que excluindo-se os monólogos ou as produções experimentais, o limite de R$ 1 milhão não permite a produção de espetáculo de teatro que envolva mais de 20 profissionais (6 no palco) com temporada de 3 meses.
E os recursos de bilheteria não poderão socorrer! Para além dos 50% já comprometidos com distribuição democrática, divulgação, patrocinadores, e vale cultura, os espetáculos teatrais precisam pagar o teatro (não menos que 25% da bilheteria), direitos autorais (entre 10 e 20%), além de participação de atores e impostos. Parece que falta ajuste para a realidade desse segmento. O limite de R$6 milhões seria mais adequado para ele.
Adicionalmente, não é possível ter espetáculo exclusivo para escolas. É uma proibição que prejudica o público atendido, sem motivo aparente. Diversamente do previsto, a distribuição de ingressos para doação de caráter social e educativo — 20% dos ingressos — deveria ser calculada sobre o total disponível nas temporadas. Espetáculo exclusivo ou a concentração em dias específicos permitem que uma escola ou alunos organizem a sua presença conjunta, além de possibilitar conversas com diretor e elenco.
As pré-estreias são o grande momento de divulgação das temporadas. Contudo, agora, as apresentações fechadas estão proibidas, ainda que realizadas com outros recursos. Aumenta a dependência dos incentivos fiscais, pois não permite a captação de outros recursos sem os incentivos, bem como atropela a prática estabelecida e eficiente da pré-estreia de espetáculos para jornalistas e formadores de opinião. Essa alteração nega a forma de divulgação mais importante dos espetáculos, normatizando verba não incentivada que não cabe ao Estado controlar.
Fica claro que novos ajustes precisarão ser feitos em função da realidade específica de alguns segmentos, e são essenciais para a manutenção da produção, desenvolvimento e acesso à produção cultural.
Advogada e autora do livro “Cultura neoliberal: leis de incentivo como política pública de cultura”