Por Cris Olivieri para o site direitocom.com 07/11/2016O filme “Chatô, o Rei do Brasil”, após muita controvérsia e uma decisão sem precedentes do Tribunal de Contas da União, teve sua prestação de contas integralmente aprovada . Foi, também,finalmente finalizado e lançado no cinema no final de 2015. O projeto do filme, iniciado em 1995, conseguiu realizar a captação total dos recursos necessários junto às empresas patrocinadoras, graças ao apoio dos incentivos fiscais à cultura previstos na Lei Rouanet (Lei 8.313/91) e na Lei do Audiovisual (Lei 8.685/93). Mas, enfrentou um longo caminho de inadimplência por não finalizar o filme no tempo legal (foram necessários longos 20 anos) e por não apresentar a prestação de contas da verba captada. Conforme determina a legislação relativa ao uso dos incentivos fiscais à cultura, cabe ao responsável pelo projeto (proponente) executá-lo conforme proposto e aprovado, bem como apresentar asprestações de contas de objetivos e financeira, com conciliação bancária e cópia de todos os documentos fiscais . É fato que o Ministério da Cultura exige regularmente e sem exceção, inclusive para projetos de execução e excelência indiscutíveis, que a prestação de contas financeira seja apresentada em detalhes (através de diversos relatórios padrão) , bem como que qualquer equívoco (não obstante a boa-fé) seja compensado com a devolução de valores, acrescidos de correção de monetária e juros . Processo no 009.010/2008¬3 IN no 1/2013 / Minc. Art. 75, § 2º, XII No caso do Chatô, face a não finalização do audiovisual, inicialmente o proponente havia sido condenado a devolução total do valor. Contudo, em tendo conseguido entregar o filme finalizado extemporaneamente, obteve parecer favorável do responsável pela prestação de contas, solicitou a revisão da decisão de 2012 do TCU. A partir daí o TCU, através de decisão inédita, estabeleceu que a entrega do produto final é suficiente para aprovação da prestação de contas. Declarou expressamente que “o atesto do MINC de que houve o cumprimento do objeto pactuado tornam desnecessária análise mais detalhada dos comprovantes apresentados, podendo as contas serem julgadas regulares…“. A jurisprudência majoritária do TCU era no sentido de que “(…) somente a entrega do produto final, sem a devida comprovação do nexo causal entre os recursos recebidos e as despesas efetuadas, não tem o condão de modificar o mérito do acórdão recorrido…”.Neste sentido, o Ministério da Cultura vem declarando a inadimplência de centenas de proponentes, bem como vem editando regularmente Instruções Normativas que detalham cada vez mais as obrigações de ordem financeira, de demonstração de nexo causal, autorizando saques para o caixa na ordem de R$100,00 (!) Conforme estabelecido no Roteiro Prestação de Contas Minc: http://www.cultura.gov.br/documents/10895/0/ROTEIRO+PC+MinC.doc/18b5d828-9796-4d68-bb24-bcad566fc7ab IN no 1/2013 / Minc. Art. 80, § 2º. O relator acrescenta “em relação aos aspectos financeiros que a Lei Rouanet não exige um tratamento para a gestão dos recursos tão rigorosa quanto o exigido por outros normativos, sendo possível o pagamento de despesas com fundo de caixa e de pequenas despesas em espécie. ”E, “…a prestação de contas de projetos dessa natureza não apresenta o mesmo rigor exigido nas hipóteses de recursos transferidos mediante convênio, quanto à necessidade de nexo entre a movimentação dos recursos e as despesas realizadas. ” Essa decisão propõe, portanto, tratamento completamente diverso do que vem sendo dado aos projetos culturais incentivados nos últimos anos, na medida em que permitiu a entrega do produto final após 20 anos e a aprovação da prestação de contas sem o escrutínio dos pagamentos, declarando-o desnecessário. Ou seja, conflita diretamente com as Instruções Normativas editadas nos últimos anos e em especial com a IN no1 / 2013 / Minc em vigor, a qual estabelece procedimentos bastante detalhados e rigorosos. Considerando a repercussão do caso do Chatô, e a declaração do Relator de que após uma longa trajetória desde a autuação do processo até a decisão de agora a finalização do documentário deve ser louvada em um país onde a produção cultural é muito difícil, podemos concluir que não se trata de decisão casuística, mas de mudança de paradigma sobre o ponto mais importante a ser considerado pelo Ministério da Cultura em suas análises – o produto final. Ou seja, em sendo entregue o produto prometido, as contas não são relevantes se parecerem corretas. Muitas decisões e penalidades, portanto,deverão ser revistas a partir daqui. Clique aqui e veja matéria original
Rouanet: governo reduz projetos, e produtores acusam desidratação da lei